Entre sem se perder...

segunda-feira, 14 de agosto de 2017

REFLEXO DA DOR

Perdi o rumo.
Perdi o plano.
Perdi o voo.

Mas, a poesia 
não se perdeu
de mim.

(...) e ela tem planos
pra toda a minha dor.

domingo, 13 de agosto de 2017

EXORBITANTE


No Brasil há 3 coisas absurdamente caras:
- VOTO;
- SENTENÇA;
- E PASSE DE JOGADOR.

DÓ EM PAUTA

Só eu sei.
Só eu sou.
Só eu sei
segredos
que jamais
contou.
Só eu sei.
Só eu sou.
Foste 
ao menos 
um dia.
Pra te juntar,
me desunia.
Pelo único caminho,
me perdia.
(...) me multifacetava
em una.
Só eu sei.
Só eu sou.
Sou a outra 
metade do teu eu.
Sou a outra metade
de qualquer eu...
Sou a metade 
que mais doeu.
Sou a metade
que jamais morreu.
Sou tua gêmea.
Só eu sei.
Só eu sou.
E de tanto
que só eu sou...
Sou eu só.

JORNADA PRA NADA

Nessa confusão
perdi alguns poemas.
Perdi muitas palavras
que me recusam.
(...) me perdi dentro de poemas. 
Existem letras soltas 
dentro de mim. 
A dor ao menos 
é alguma coisa. 
A dor ao menos 
está presente. 
A dor ao menos 
permanece. 
A dor me faz viva. 
Teu eco 
é ego... 
Também te nego 
por puro ego. 
Antes só, 
do que sem mim. 
Antes só, 
do que todas em una. 
Antes só... 
Só antes... 
Só depois. 
Depois, só.

A VAGA

Fui embora de mim,
pra nunca mais...
Mas voltei e 
estava ocupada
por uma outra.
Tentei despejá-la...
Mas ela não queria sair.
Ela se acostumou comigo,
eu com ela...
Ela se foi.
Morreu.
Ao morrer abriu vaga.
Tenho uma vaga lembrança
de tudo e tudo vaga em mim.
A vaga está sempre aberta...
apenas para fantasma,
que nunca vive,
só desencarna.

TEORIA DA SOLIDÃO



Aquele que tem
um ego muito grande
é um egocentrista.
Aquele que tem
um ego muito, muito, muito, muito, muito grande
são múltiplos egos.

DESACORTINADO


De um lado, a luz...
De outro, o espetáculo.

REDUCIONISTA



O Ipê se vestiu de lilás para ficar em casa.
Fiz amizade com um bando de papagaios.
Muitos pássaros se banham na piscina.
A casa toda cheira a onça.
Nem precisa ir ao zoo.
Basta estar na sacada.
Esses dias levei um ovo pra sala.
Choquei as visitas.
Era arara, era!
Não deu tempo de nada.
Não deu tempo de mostrar nada.
Ah, meu mundo extraordinário!
Ah, só pra que tu saiba...
Eu também falo com os animais.
Também sei o segredo que escondem.
Agora tenho uma tartaruga como almofada.
Adotei uma porca,
já que me faltam parafusos.
Mas, deu zebra.
Tudo bem.
Eu entendo.
Algumas pessoas conseguem
diminuir muito o tamanho das coisas.

¡Lo siento!



De dentro da câmera de horrores
Haverá de haver justiça.
O espelho te será Tribunal do Juri
Não és paraguaio,
mas todos te sabem falso...
Usa tua máscara de dormir,
de acordar, de viver, de sentir...
Tortura a si mesmo, 
sem saber nunca o que vestir,
nem o que está por vir (...)

POEMAS MENTAIS



O papel aceita tudo (...)
Queria poder morrer hoje.
Bem no começo da tarde.
Não atrapalho o chá das cinco.
Queria poder ir embora.
Conhecer onde se mora pra sempre.
(...) mas não existe pra sempre. 
Fui informada 
que tudo é impermanente.
Então (...)
O que há dentro de mim
que não me deixa?
O que é isso
que me acompanha?
Que não me deixa 
nem quando tento ser outra?
Que não me abandona
em circunstância alguma?
Como explicar a presença da falta?
Como justificar a tua ausência?

POR ÁGUA ABAIXO



Nunca os céus choraram tanto...
Nunca os olhos choveram tanto...
Nunca os esgotos salivaram tanto...
Nunca as bocas transbordaram tanto...
Nunca tanto...
Não acabou...
As palavras continuam aqui.
Batem ponto.
Comparecem diariamente ao trabalho.
Tudo em mim é choro,
solidão e sofrimento.
Não comemoro nada em respeito a tua morte.
O céu se envergonha de continuar azul.
Só não visto luto (...)
porque todos os dias me lembro
que tu precisas permanecer vivo.

CARO, CARÍSSIMO...


Aproveito o branco 
para colocar o preto.
Nunca soube como...
Não me chamo Beatriz,
mas pretendi,
ao menos uma noite,
ser tua única atriz.
Criei cenários.
Se não fomos,
se não somos...
Foi o medo 
do que poderia ter sido.
Sei que casados.
Tenho medo de assassinos
de histórias sem fim.
Por anúncio do fim 
nunca começo.
Não te dei menos.
Foste meu, és meu...
Habitas em mim.
Sou o mais recôndito lugar.
Teus versos são meus
e não me importa 
que escrevas para outra. 
No fundo,
escreves só pra mim.
Tenho medo do palco...
de errar a marca, 
de dar texto.
Tenho medo de cortinas:
- Elas fecham.
Não posso ser morta 
novamente.
Nessa vida, 
não posso ser morta,
de novo. 
Seria Desdemona (...)
Em teus braços
não haveria outro papel.
E pode ser caríssimo,
Caríssimo.

D'ACCORD



(...) se as pessoas tivessem ideia de que o espírito, em seu estado puro, não tem sexo, voltariam a se reconciliar, de maneira definitiva, com a sua contraparte. Seríamos menos machistas, menos feministas para sermos todos, mais andrógenos.

PROPORÇÃO ÁUREA


Deus não é arquiteto,
Deus é designer.

JUNTOS


Sou aquela que veio antes.
Sou quem permanecerá.
Sou quem voltará sempre.
Sou a eterna espera.
(...) aquela a quem não se pode apagar.
Sou quem nasce junto contigo.

MESTRE



Quem insiste em nos nomear lagartas,
quer nos ver borboletas.
Descofie de quem te chama de borboleta.

EM NOITES DE TEMPESTADE



Deus caminha na escuridão.
A escuridão não enxerga no escuro.
Acende uma fagulha e
Deus se faz enxergar.
A treva não se contenta com pouco...
não quer faísca, quer vela...
Deus mandou um castiçal.
A escuridão queria mais...
O iluminado 
enviou seu candelabro. 
Não bastou...
E não bastou lanterna
pra quantidade de névoa.
A luz, generosa,
aportou um anjo de auréola.
Era menina e chorava.
A escuridão mandou embora 
a criança, a mãe e a ingenuidade.
A escuridão obscureceu a versão.
A escuridão foi aumentando,
aumentando...
A escuridão quer ser infinita.
Mas infinito é o amor divino.
Deus acendeu holofotes azuis.
Os holofotes desejaram lâmpadas
para iluminar a cena... lâmpadas
também azuis celestes.
A escuridão não se conteve.
Cegou pra sempre os olhos.
Numa última tentativa,
Deus mandou a Lua cuidar do assunto...
A Lua ilumina a escuridão de todas as noites.
A escuridão riu da Lua.
A sombra achou que a Lua minguaria.
Mas Ela cumpre preceitos divinos.
Mesmo que viva mudando de face
é sempre anunciação.
A escuridão aumentou muito, muito...
... mata muito devagar o menino sombrio
(...)
Que podendo ser iluminado até por pirilampo,
prefere que Deus envie, envie relâmpago.

GOSTO PELO DESGOSTO

Pra se fazer gostar,
só gasta e se desgasta (...)

O MAR DE MAIO


Lembra que chovia muito?
Lembra que chorava muito?
Lembra do sonho?
Era rainha num castelo.
(...) me afogava sozinha
no próprio soluço.
Dançava sozinha na chuva.
Lembra que contei?
Lembra do pesadelo?
Lembra que eu era deixada?
Lembra que eu era rainha?
Numa sala dentro d'água...
Alagou o apartamento
e a chuva invadia as paredes
e os anjos boiavam ao meu redor.
Lembra que tu fugiu?
Lembra... Lembra...
Temos que lembrar
pra poder esquecer!

RESPIRAÇÃO BOCA A BOCA


Pulmões cheios de letras,
palavras que me afogam.
Dizeres encobertos por areia.
Muitos pontos que a maresia
levou embora e ponto.
Há uma discussão pelo sentido
que o vento sopra, 
que o vento cobra.
Há necessidade de socorrer
um corpo sem identificação.
Papéis em branco boiam
em alto-mar que sangra.
Clama por significado,
só reivindica sepultura.
Há vestígios do meu eu
levados no casco dos navios...
Com sal e poesia
faço curativos nas frases
que estão morrendo.
Não adianta mais (...)
A onda rebenta
e leva tudo o mais que
eu pretendia te dizer (...)
Não vou dizer
pra sempre.

VOLTA SEM FAZER BARULHO


Tenho navegado 
e não saio do lugar.
Ouço muito pouco.
Algas marinhas crescem
nos meus cabelos,
entram nos ouvidos.
Quando puder volta.
Não existe viagem
sem retorno.
Marina pensa que é peixe.
Quando voltares 
vou estar dormindo.
(...) me acorda devagar.
Tive um sonho ruim.
Sonhei que tu 
tinhas nos matado.
Vou acordar toda molhada.

MERGULHO EM AQUARELA


Dentro de mim vive o oceano.
O mar se afoga
no meu próprio choro.
Não quero ouvir 
ninguém me chamando.
Tempo passa em conta-gotas.
Sei que sou eu, 
mas pareço muitas ostras.
Saudade é como partículas d'água
(...)
Existem em todas as partes,
e se apresentam de todas as formas.
Eternidade não é tempo sem fim,
é tempo algum.

INCRE-ACREDITAR


Em alguns casos,
a vida nos requer
suspensão da crença,
e não da descrença.

DOR DE OUVIDO

Agora sei tudo...
ou quase tudo...
ou tudo que precisava.

Agora sei
que o canto da sereia
é um choro,
um lamento.

Agora sei 
o que é beber o mar...

Choram meus tímpanos
um coração sem sangue,
um coração casulo.

Não procurem meu corpo,
se minh'alma está perdida.

Permitam que permaneça
sepultada aqui pra sempre.

Desliguem o sonar.
Era só amar (...)
Mas é só mar.

COM O PERDÃO DA SUA LICENÇA


E Deus
- generoso que é - 
criou a poesia.
(...)
Emprestou para alguns
- ditos poetas -
a mais absoluta falta de sentido.
Queria com isso,
presentear os ateus
com um pouco de sua divindade,
sem que eles se ofendessem.

DREAMS OF THE OCEAN

Às vezes, sentava 
uma pedra junto a mim.
Até elas se moviam...
Era o universo tentando
me consolar.
Em espírito mesmo,
sai poucas vezes...
Esperava te ver chorando...
Esperava 
ao menos uma lágrima,
um pedido de desculpas.
Fiquei com tua filha
guardada no ventre.
Ela saiu nadando...
Já estava dentro d'água.
Saiu logo nadando,
sem saber que era gente,
e nem que estava morta.
Só queria que tu nos buscasse
(...)
Gostaria que tu visse 
como ela se parece contigo.
Só queria que tu nos buscasse
(...)
Para que pudéssemos passear
fora d'água,
como fazem todas as famílias.

AMAR NO FUNDO DO MAR

Esta é mais uma mensagem do mar.
Escrevo esta carta daqui onde habito.
Das profundezas do que fomos.
Não consigo subir à superfície.
Habito cemitérios aquáticos.
Virou meu hábito a grande calunga
que ninguém sabe que existe.
Daqui te lembro todos os dias.
Há muitos anos choro a tua culpa.
Daqui me recordo como era
quando eu era viva.
Todos os dias...
uma grande mãe-grande e celeste
tenta enxugar minhas lágrimas.
(...) É que estão preocupados
com alta das marés.
Nesta escuridão todos me cuidam
e tentam ser meus amigos.
Todos a minha volta 
sabem que morri.
Romperam-se meus ouvidos,
mas a dor que sinto é na alma.
Às vezes, muito raro,
enxergo uma luz.
É a esperança de ver
o teu corpo afundar a 
procura do meu.
Queria que te arrependesse
e me buscasse aqui...
mas é preciso estar morto.
Se afogar não é fácil...
e não estou mais do teu lado.
Então, ninguém te leva na beira.
Quando tu te despediu
dos meus olhos, 
eles eram azuis.
Não sei sair daqui...
Não encontro a saída...
E me agrada continuar
aumentando o nível d'água.
Com a fúria da correnteza
pode ser que homens afogados
aprendam a amar.
Por amor,
eu nunca mato,
mas sempre morro.

PINCEL AZUL



A poesia e a música são
como as almas gêmeas
(...)
basta que uma exista,
e pressupomos 
a presença da outra.

YONI



Podia escrever
com qualquer secreção.
Com bile, por raiva.
Com linfa, por defesa.
Com lágrima, por desespero.
Com sangue, por drama.
Com saliva, por menosprezo.
Com suor, por trabalho.
Mas escrevo 
com o néctar de Shakti
(...)
de tanta vontade dar 
o recado.

JUREI TEU NOME



(...) Se eu morresse hoje.

Muitos casais os adotariam...
E os adotarão sempre.

Filhos morrem,
poemas são perenes.

A MELHOR IMAGEM


Fantasiei teu nome, 
tua bondade,
teu choro,
tuas verdades
(...) eu acreditei.
Nada mais ingênuo
que o amor verdadeiro...
E buscava um símbolo
que melhor representasse.
Mas como representar
o desintegrado?
Como representar
o que não existe?
Como representar 
uma farsa, um fake?
Como representar
um suicida?

DEVER


Talvez devesse ir até aí...
Talvez devesse sair do lugar...
Talvez devesse procurar...
Talvez devesse tantas coisas...
Suporto...
Suporto porque
me ocorre pensar
que talvez devesse (...)

SOLSTÍCIO DE INVERNO



Feche todas as janelas.
Está muito frio.
Quer que eu vá?
Fecho todas as janelas.
Fecho janelas
e abro persianas...
Persianas americanas.
Sei lidar com cremonas emperradas.
Feche as janelas.
A vida acontece do lado de fora.
Estou sem roupas,
é preciso que abra a porta...
Olha através do espelho.
Olhe pra si mesmo.
Olhe pra lua.
É quarto minguante.
Sente o vazio.
Abre a porta (...)
Estou morrendo,
e não é de frio.

AMOR METÁSTASE


Eu te queria assim...
crescendo, crescendo
e tomando parte de mim.

Agora, 
não respiro, não como,
nem me movo.

Nunca fui abraçada
por tantos braços...

Para qualquer um
o tratamento é tópico.
Pra mim utópico.

ONI


Deus passou o dia na Savana.
Estava com saudades do estábulo.

Deus limpou a lente do microscópio,
na mais recente descoberta científica.

Compareceu a última
declaração de guerra.

Aplaudiu de pé 
uma estreia no teatro.

Esteve presente ao um studio, 
acompanhar alguém 
que decidiu tatuar o demônio.

Encontrou o silêncio dos Lamas
no alto da montanha.

Comeu comida vegana 
e seguiu para um abatedouro.

Deus ouviu atentamente 
a versão do crente 
sobre ele mesmo.

Cansado,
tirou um cochilo, 
ao lado do mendigo,
de seu cachorro
e de todas as pulgas.

Rio muito com as piadas
que os ateus contaram
no final do Congresso.

Preciosista (...) 
acompanhou a geada no campo.

Aguardou uma gota de orvalho
que retornou para dentro do lago 
que lhe aguardava há anos.

Sentou e acompanhou 
uma ocultação de cadáver 
no meio da floresta.

Cruzou uma encruzilhada 
e cumprimentou um guardião
que estava de ronda.

Cortou o cordão umbilical 
do último humano
que acabou de nascer.

Empurrou um menino, 
que quebrou o pulso,
mas desviou da bala.

Segurou o choro, 
ao assistir o casal que se amava, 
fazendo amor...

Deus deu dois moshs
num show de Rock in Roll.

Acompanhou o momento
em que o esquizofrênico percebeu 
que estava sendo chamado.

Fez tudo,
tudo o que podia,
ao mesmo tempo... 
como em todos os dias.