Entre sem se perder...

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Há uma espécie insuportável:
os que acertam com humildade
os mesmos aqueles
que erram com soberba.

Para que fale mais alto


Das vezes que Deus me procurou
fora sempre escutado.
Das audiências nossas
sequer sussurro
...aos berros
só ouço o seu calar.

Sobre ser poeta


O poeta é simplesmente
o dono do pomar de limões...
cuja terra só permite
estas deliciosas frutas.

Resgate de pedido

Não há o que assegure um porto.
Resta a vista com muita terra.
Dos muitos naufrágios
conto apenas com esta pesada embarcação
de poucos pés.

A qualquer momento



Entendo aquela moça, já quase senhora
segura pela xícara.
Entendo aquela jovem senhora
que contempla o bafo que lhe acena.
Entendo aquela senhora
tomando esperança num único gole.
Entendo aquela que queria ser menina
por isso suspira café.
Entendo aquela mulher
que fuma entre o descansar do braço.
Entendo esta velha senhora
que passa suas mágoas no filtro
mistura quatro de açúcar e mexe.
Entendo esta que se segura
pretendendo a proteção da asa.




Distorcida


Construíram minha existência.
Imagens verdadeiras
opiniões falsas.
É como se minhas imagens fossem falsas também.
Memória é a única testemunha viva.
Fizeram com que acreditasse em algo que eu não era.
De repente, cheguei a acreditar.
Convivi com toda a mentira sobre mim.
Hoje quando vejo a tia gorda de alguém dizendo:
Quando tu eras pequena...
Tenho pena da criança!
Tudo que pretendem?
Fazer a fulaninha pensar que é pequena
e pro resto da vida.
Fazem a fulaninha acreditar na versão deles
sobre ela própria.
Aquele filme estava certo...
Todos deveriam ter acesso ao seu banco de dados.
Todos poderiam reeditar algumas partes.
Odeio as pessoas reconstruindo aquilo que a gente era.
Todos lembram do naufrágio
do barquinho afundado no papel.
Recriar um eu que não existe
faz pensar que era uma criança má
maquiavélica.
Quando na verdade sou apenas um adulto
que por causa disso não cresço.

Confidencial

Na data de hoje perdi meus arquivos.
Por conseqüência precisei te esquecer.
Não me lembro de ti nem com esforço.
Às vezes, te vejo na rua e não te reconheço.
Às vezes, me vejo contigo e não me reconheço.
Às vezes, muito raramente, lembro de ti.
Com esforço, lembro de ti.
Na verdade é raro lembrar que tu existiu.
Em verdade não lembro quando foi que te esqueci.
Mas esqueci qualquer coisa minha contigo.
E te peço, se possível fosse
qualquer dia desses
se não fosse muito
gostaria
se tu te lembrares
(...)
passa aqui e me deixa.

Fechando as janelas


Há três dias não arrumo a cama.
Há uma semana não lavo a louça.
Há quinze dias não cozinho.
Há um mês não fazemos amor.
Há um ano não moderamos a fala.
Há três anos não tiramos o lixo pra rua.

A vida toda escreverei poemas.